Don Juan, o burlador de Sevilha (9)

Em solo dinamarquês, o mítico Don Juan aportou pelas mãos do jovem, filósofo e teólogo Sören Kierkegaard ao escrever Diário de um Sedutor em 1843 e publicá-lo com o heterônimo Johannes de Silentio. Eleito precursor da filosofia existencialista, sua obra contém o enlaçamento decisivo da filosofia com a literatura.

Nascido em Copenhague, Kierkegaard era filho de pastor luterano e rico comerciante de lã. Sua infância marcada pelo temor a Deus e sentimento de culpa que o mergulhava na angústia e melancolia. Era cocho e com precária autoestima. Ingressou na universidade com o propósito de estudar teologia e em 1837 conheceu Regina Olsen, jovem de 17 anos com quem iniciou namoro, prometendo fidelidade e casamento após concluir os estudos. A morte do pai interrompeu os planos do jovem Sören.

Continue reading

Don Juan, o burlador de Sevilha (8)

Na terra de Shakespeare, o mito do burlador de Sevilha aterrissou tardiamente. Dominados pela potência moderna dos heróis tragicômicos shakespeariano, os ingleses foram

atingidos em 1818, pela meteórica obra Don Juan escrita por George Gordon Byron, o mais transgressor dos poetas do romantismo na Grã Bretanha, conhecido como Lord Byron. No solo do Reino Unido, o mito foi narrado de forma suntuosa: epopéia cômica composta em 16 cantos (interrompidos com a prematura morte do autor aos 36 anos) com estrofes de 8 versos de 12 sílabas. Este estilo lhe permitiu esculpir o mítico sedutor licencioso de Sevilha numa estatura de herói grego clássico: Don Juan, um patético e romântico Odisseu moderno.

Continue reading

A Língua Paterna do Amor

Seguimos catalogando as paixões. Dado o soberano valor atribuído ao amor, vamos abordá-lo pela linhagem (linguagem) paterna. Nossa referência é o mito, pois ele contém a primeira forma de representação das paixões. Muito antes da emergência do pensamento filosófico na Grécia (século 4 a.C) e do pensamento científico (século 17), os humanóides contraíram e construíram narrativas mí(s)ticas para designar as paixões.

Nas edições anteriores da Arraso destaquei a filiação de Eros e sua transmissão pela língua materna. O ponto de ancoragem dessas reflexões nos foi transmitido por Platão no diálogo O Banquete. Relembrando: cada um dos convivas deveria fazer um elogio ao deus Eros. Estrategicamente, Platão deixou Sócrates por último. E, é claro, o irônico personagem arrasa. Sócrates contou ter ouvido de uma mulher, Diotima (sacerdotisa do templo de Afrodite) a seguinte história da fecundação de Eros: num banquete em comemoração o nascimento de Afrodite (deusa da beleza e dos prazeres), Póros se embriagou do néctar e adormeceu no jardim da morada de Zeus. Por ali perambulava Pênia, em sua penúria, nutria a esperança de recolher as migalhas do festim. Ao ver o belo Póros adormecido desejou ter um filho dele. Deitou-se ao seu lado e concebeu Eros, o deus do Amor. Eros é filho de Pênia com Póros.

Continue reading

Don Juan, o burlador de Sevilha (7)

Da versão francesa do mito Don Juan, encenada pela “comédie française” de Molière, à versão italiana na “commedia dell’arte”. Don Juan é um personagem teatral esculpido na letra espanhola como El Burlador de Sevilha. Dentre as dezenas de peças teatrais em solo italiano, desde o alvorecer do século 17, destaco apenas um aspecto do libreto Don Giovanni escrito por Lorenzo da Ponte. O libreto foi musicado por Wolfgang Amadeus Mozart compondo a monumental ópera que estreou em Praga em 1787. Seguindo a proposta desta série, atenho-me à letra, ao aspecto literário do libreto e, com isso, sustento nossa premissa inicial: Don Juan é o primeiro mito moderno. A popularidade do mítico burlador na Itália é atestada desde 1699 com a peça musical: O Ímpio Punido composta por Alessandro Melani com libreto de F.Acciaiuoli. Esta versão também é conhecida como O Convidado de Pedra. Em 1736, Goldoni escreveu o livreto Don Giovanni, o Dissoluto Punido, atribuindo ao mítico sedutor um julgamento moral predominante em outras versões: o destaque aqui é a punição (juízo final) pelos crimes contra a honra cometidos pelo galante conquistador de mulheres.

Continue reading

Don Juan, o burlador de Sevilha (6)

Seguimos com os comentários da versão francesa do mítico Don Juan escrita pelo dramaturgo Molière no século 17. A peça teatral, Don Juan ou o

Retornemos ao argumento sobre o casamento como estratégia de conquista do habilidoso sedutor. Leporelo diz a Gusmão (servo de Dona Elvira): “para realizar sua paixão predominante ele não hesitaria em casar também contigo, teu gato e o teu sapato. Um casamento não lhe custa nada; é só uma estratégia para atrair as tolas; casa como respira, sem mesmo perceber”. A paixão predominante de Don Juan é seduzir para incluir na lista das mulheres conquistadas: mais uma. A sedução é a arte da conquista. Nesta perspectiva, Don Juan é um artista.monarquia francesa. Festim de Pedra, realizou a desconstrução da moral religiosa que legitimava a sociedade aristocrática. Tal acontecimento ocorreu no interior da própria sociedade de corte, no Palácio Royal em Paris, morada do Cardeal Richelieu, o grande articulador político, estrategista e retórico conselheiro da

Continue reading

Psicanálise e Filosofia