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O Tempo e o Templo (5)

No fragmento atribuído a Heráclito encontra-se a mais bela definição de tempo: “O tempo é uma criança que brinca, movendo as pedras do jogo para lá e para cá; é governo de criança”. Instalada no instante presente, a criança não tem consciência do antes e do depois, do passado e do futuro. Seu tempo é o prazer obtido pelo ato de brincar. Considerando o princípio que rege a filosofia heraclitiana pode-se deduzir o valor simbólico da metáfora contida no fragmento. O tempo é um fluxo constante e ininterrupto, um vir-a-ser contínuo, o devir do ser: é puro acontecimento inscrevendo o movimento no qual todo o ser procura sustentar sua existência.O Tempo e o Templo 5

Estar no mundo é estar no tempo. O tempo é uma procissão de instantes entre o horizonte memorável do passado e as expectativas do futuro. Do passado só podemos relembrar para justificar o presente, dando-lhe sentido e significação. Do futuro, mantemos a ilusão de um controle, planejamento e previsibilidade. Quimera humana a sustentar nosso desamparo frente às contingências e circunstâncias que não dependem de nossa vontade. O futuro é um oceno de possibilidades governado pela deusa Fortuna à qual estamos submetidos. Podemos rememorar o passado e não podemos prever o futuro.

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Odiar a Si Mesmo é Autoflagelo

A palavra paixão carrega consigo dupla rede de significação: por um lado, estar apaixonado é sentir um amor ardente, um estado de arrebatamento, contentamento, entusiasmo, bem querer; por outro, é provocar aflição, flagelo, tristeza intensa em alguém ou a si mesmo, mal querer. Amar e odiar são paixões primárias mobilizadoras de afetos e definem a relação pulsional entre o Eu e o objeto.

O problema consiste quando o próprio Eu é o objeto de investimento do ódio. Pode parecer trivial quando no momento de raiva, a sentença “Eu me odeio” é enunciada. Há, no entanto, uma dimensão inconsciente deste ódio a si que se revela na forma de um gozo masoquista: o prazer em sofrer, em imputar-se sofrimento sem causalidade somática, orgânica. Obter prazer na dor é um autoflagelo.

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